16º Ato (Post) THE FLY (The Brundlefly and The Martinfly) Pág. II       
                                                                                                                     

A   O R I G E M  



 " Até que eu esteja totalmente extinta, nada me fará esquecer aquela terrível cabeça branca e peluda com seu crânio rebaixado e achatado e suas orelhas pontudas. Seu nariz, róseo e úmido, era de um gato - um gato enorme. Mas seus olhos! Ou melhor, onde seus olhos deveriam estar, eram dois discos marrons do tamanho de pires. Em vez de uma boca, animal ou humana, havia uma fenda vertical, longa e peluda, da qual pendia uma tromba negra, que ampliava-se no fim numa trombeta, da qual gotejava saliva. "
Langelann, George: The Fly. 1957. Tradução e Adaptação por 'Doc Hanni' ( MN )



 A fábula de Langelaan é, ao mesmo, genial e perturbadora...

 No original, publicado em junho de 1957, a personagem François Delambre é acordada, tarde da noite, com um telefonema de sua cunhada, Helene. Ela informa-lhe que acabara de assassinar seu irmão, André, e que ele deveria contatar a polícia. Ao chegarem a cena do crime - uma fábrica da família Delambre - François e a polícia encontram o corpo de André sob uma prensa hidráulica, com a cabeça e o braço indizivelmente macerados! Helene entrega-se e, parecendo surpreendentemente calma, narra com minúcias os detalhes do crime - como de fato somente o assassino poderia fazê-lo.

 Ela deixa, no entanto, apenas um 'detalhe' sem explicação: sua motivação.

 Ante a 'frieza' da ex-esposa e a crueldade com que parecia ter executado o cônjuge, Helene é recolhida a um sanatório, enquanto a custódia do filho do casal, Henri, vai para François.
 François visita Helene com regularidade, mas sem obter dela a reposta à mais importante das indagações: a razão pela qual ela assassinara André Delambre. Certo dia, Helene surpreende François com uma pergunta aparentemente despropositada: quanto tempo viveria uma mosca? Na mesma data, Henri conta a François que vira a estranha mosca que sua mãe pedira-lhe para procurar: uma mosca com a cabeça branca.
Cônscio que essa poderia ser a chave para a cadeia de eventos que culminara com a morte de seu irmão, François usa a história da criança como isca para pegar Helene. De fato, ao saber que o filho vira o singular inseto, Helene transfigura-se, saindo da aparente apatia para a histeria. François ameaça-lhe então: se ela não contasse toda a verdade sobre a morte de seu irmão, ele iria a polícia contar tudo o que sabia sobre a 'mosca com a cabeça branca'. Helene então pede que ele volte no dia seguinte, quando ela entrega-lhe um relato manuscrito...

 Ela suicida-se mais tarde, naquele mesmo dia.

 O relato de Helene é inacreditável: no manuscrito, ela narra com detalhes as experiências do marido, André Delambre, com um par de equipamentos denominados 'disintegrator-reintegrators' ( em port.: 'desintegradores-reintegradores' ) capazes de 'transmitir' matéria de um ponto a outro do espaço, sendo uma máquina o 'desintegrador-transmissor' e a outra o 'receptor-reintegrador'.

 Êita troço 'piçado' aquele...!

 Foram necessários numerosos infortúnios até fazê-los funcionar corretamente: numa experiência, André reintegrou um cinzeiro com a frase 'made in Japan' escrita ao contrário ( Nota 4: esse argumento foi preservado na adaptação do conto para o cinema. Não obstante, o remake de 1986 também o evocou com ressalvas: Seth Brundle tenta teletransportar um babuíno com um resultado catastrófico! Quando inquerido por Veronica Quaife, Seth explica-lhe o ocorrido dizendo: 'Acho que virou o babuíno do lado avesso.' ). Em outra experiência, André tem sucesso ao desintegrar o gato da família, mas não consegue rematerializá-lo ( Nota 5: esse argumento também é preservado na adaptação de 1958 e evocado no remake de 1986, numa cutscene conhecida como 'Sequência do Macaco-Gato', conforme veremos em tempo ).
 André persistiu e, após conseguir ( aparentemente ) aperfeiçoar seu engenho, ousou tentar usá-lo em si mesmo... com terríveis consequências...!! Desapercebidamente, uma mosca doméstica entrou com ele na cápsula transmissora e, ao reintegrarem-se, André e a mosca haviam trocado entre si as cabeças e um de seus braços...!
 André passou então a cobrir sua cabeça com um saco e a manter sua mão/garra no bolso - afim de não assustar Helene. 'Conversando' com ela somente através de mensagens escritas, ele pede-lhe que busque pela casa uma 'mosca com a cabeça branca' - de fato, a sua cabeça - na esperança de tentar repetir a experiência e reverter o processo.

 Helene busca pelo bizarro inseto por toda a casa, mas sem sucesso...! 

 Sem muitas esperanças, Helene convence André a repetir a experiência sem a mosca da cabeça branca, na expectativa que - por caminhos misteriosos - algo reverta-se. Ante a insistência da esposa, André cede, desmaterializando-se e rematerializando-se novamente. Afoita, Helene vai até ele retirando-lhe o capuz...

 ... então confrontando o indizível...!!

 Não apenas a cabeça e o braço da mosca ainda permaneciam em André, como também ele 'assimilara' partículas do gato da família ( desmaterializado nas primeiras experiências ) tornando seu rosto num disforme e horrendo mosaico ( Nota 6: esse foi outro argumento preservado na adaptação de 1958, o que explica os estranhos 'bigodes' que o 'Andréfly' possui...




 ... quando seu rosto é revelado por Helene, personagem da canadense Patrícia Owens ).
 Sabendo-se além de toda a redenção, André destrói todo o seu trabalho e pede a ajuda de sua esposa para suicidar-se entre as plataformas de uma prensa hidráulica, que pulverizaria suas partes mutantes.
 No dia seguinte, François convida o inspetor Charas - o encarregado da investigação - para vir a sua casa, nonde divide com ele o conteúdo do relato da finada Helene. Ambos decidem-se por destruí-lo. Não obstante, Charas mostra-se incrédulo ao relato, argumentando a François que Helene deveria estar mesmo louca. François, no entanto argumenta-lhe que, naquele mesmo dia, 'enterrara' uma mosca no túmulo de seu finado irmão...


 ... uma mosca que tinha a cabeça e um dos braços brancos...




 O conto tornou-se um cult rapidamente, atraindo a atenção do cineasta alemão Kurt Neumann ( 1908-1958 ) diretor de clássicos como 'Tarzan e a Mulher-Leopardo' ( 1946 ), 'Da Terra à Lua' ( 1950 ) e 'Kronos, o Monstro do Espaço' ( 1957 ), que o produziu e dirigiu.
 O roteiro foi adaptado a partir do conto de Langelaan pelo autor e diretor James Clavell ( 1924-1994 ) e contou com o legendário Vincent Price ( 1911-1993 ) no papel de François Delambre...




 ... David Hedison ( creditado como 'Al Hedison', o imortal Capitão Crane da telessérie 'Viagem ao Fundo do Mar'; de 1964 a 1968 ) no papel de André Delambre...





 ... além da já mencionada Patrícia Owens ( 1925-2000 ) e de Herbert Marshall ( 1890-1966 ) como o inspetor Charas.


'A   M O S C A   D A   C A B E Ç A   B R A N C A'*
(1958) 



 Clavell não deixou de inovar ( diria: aperfeiçoar ) o original de Langelaan, fazendo uma breve ( porém muito bem vinda ) alteração no curso da trama...

 Ao final da narrativa de Helene, quando dava-se por certo sua condenação perante a justiça, o filho do casal, Phillipe ( papel de Charles Herbert; 1948-2015 ) procura François ( Price ) informando-lhe que achara a 'mosca da cabeça branca': ela estava no jardim - presa à teia de uma aranha-marrom. François convence então o Inspetor Charas a acompanhá-lo até o jardim em busca da teia e da 'mosca da cabeça' branca presa a ela. Lá, eles encontram a teia e à monstruosidade a ela presa... 





 ... prestes a ser devorada e 'gritando', sob um eco ultrassônico, a frase 'Help-me' ( do ingl.: 'Socorram-me' )!

 Em um ato, misto de horror e desespero, Charas destrói a teia com uma enorme pedra. 

 François argumenta a Charas então que ele era "tão assassino quanto Helene", visto que "ela matara um homem com a cabeça de uma mosca e ele uma mosca com a cabeça de um homem."
 Assim, ambos arquitetam um ardil que inocenta Helene da acusação de homicídio.

 A sequência ( intitulada 'Help-me! Help-me' ) tornou-se tão icônica, que foi nomeada à lista das '100 Melhores Citações de Filmes' do American Film Institute ( A.F.I. ):


* 'The Help-me! Help-me Sequence' ( 'A Sequência do Socorram-me', em português ) - The Fly 1958; 20th Century Fox.*
CONTÉM CENAS FORTES!


'A   M O S C A   D A   C A B E Ç A   B R A N C A'*
(1958) 
R E C E P Ç Ã O   &   L E G A D O

* The Fly ( 'A Mosca da Cabeça Branca', no Brasil ) - 1958; 20th Century Fox.*


 'A Mosca da Cabeça Branca' foi um grande êxito comercial. Estima-se que o filme tenha faturado $ 1.7 milhões de dólares de bilheteria internacionalmente!

 O filme também foi um sucesso de crítica; The Fly ( 1958 ) sustêm atualmente o certificado de 'Fresh' por 95% dos agregadores/expectadores do Rotten Tomatoes! O filme também recebeu quatro estrelas ( de cinco ) pelo guia online Allmovie!!
 Na animação 'Hotel Transilvânia' ( de 2012 ) a personagem 'Flyman'...





 ... foi, explicitamente, inspirada no 'André-fly'.
A americana Funko ( há 18 anos no mercado ) sustêm em sua linha um item inspirada no 'André-fly'...




 ... que ainda é encontradiço ( no Brasil ) através do Mercado Livre.
 'A Mosca da Cabeça Branca' também inspirou duas sequências: The Return of The Fly ( 1958 )...




 ... exibido aqui no Brasil sob os títulos 'O Filho da Mosca' ou 'O Monstro dos Mil Olhos', com Price de volta ao papel de François Delambre; e The Curse of The Fly ( 1965 )...




 ... exibido sob o título 'A Maldição da Mosca' ( Nota 7: ambos pela Rede Globo de Televisão ). Os dois filmes ( produções menores, acrescente-se ) forneceram subsídios para 'A Mosca II' ( de 1989 ) conforme veremos em tempo.

 Pouco mais de duas décadas depois de The Fly ( 1958 ) o co-produtor Kip Ohman ( 1946-1987 ) aproximou-se do roteirista Charles Edward Pogue com a idéia de refilmar o clássico dirigido por Kurt Neumann...
 Era o pontapé inicial de uma cadeia de eventos que daria a David Cronemberg seu maior êxito comercial!

Pág. II

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